I
Senhoras e senhores,
aqui estou. Ou melhor: heis-me aqui,
entre a queda e a paranoia,
só para dizer o meu nome
e pra dizer que amo vocês.
Mentira minha, é claro,
porque não vou dizer o meu nome
e nem amo vocês. Amo somente os combustíveis:
gasolina, álcool, querosene e eventualmente alguma toxina. Amo a deus também.
Um deus que me ama e entende, um deus que alucina.
(Quem será?)
Faz algum tempo, mudei de cidade:
vim parar numa cidadezinha suja e malcheirosa ---
repleta de fábricas de celulose; cidade industrial.
E, desde então, tenho a mente poluída.
E, desde então, venho ganhando a vida
como assassino contratado.
Mas até que gosto dos sonhos que me fazem sofrer
e dos pesadelos que acabam comigo.
II
Sou contemporâneo dos mendigos incendiados e mortos no Brasil.
E dos monges tibetanos que se autoflagelam, em protesto,
atirando fogo em seus próprios corpos e roupas
em plena praça pública.
Vejo poesia em quase tudo:
plantações de papoula no Afeganistão,
o suicídio do Kurt Cobain,
Nelson Rodrigues...
E pessoas que apresentam comportamento contraditório.
Acredito realmente em artistas!
E, assim como Lúcio Flávio,
bandido carioca da década de sessenta,
sou passageiro da agonia --- permanente.
Obrigado.